Digna de nota a vitória do brasileiro Everton Lopes, primeiro do país a se sagrar camepão mundial de boxe amador, título conquistado no sábado no torneio realiado em Baku, no Azerbaijão, competindo pela categoria meio médio ligeiro, até 64kg. Além dele, o Brasil conseguiu um bronze com Esquiva Florentino, que carimbou também passaporte para Londres. O atleta, do Espírito Santo, é filho de Touro Moreno, boxeador de 75 anos com uma história intrigante contada em boa reportagem da Folha esta semana e que será tema de um documentário a ser lançado no ano que vem.
A história de Everton não foge do padrão de atletas que dedicam suas vidas a esportes marginalizados e pouco valorizados no Brasil. Da Bahia, Everton, que antes queria ser jogador de futebol e mudou de esporte aos 15 anos, se mudou para São Paulo com 16 anos para treinar. Foi peão e lavador de carros e hoje, com 22 anos, ganha R$ 3.100 por mês – desde 2010, com aumento do repasse da Lei Piva para R$ 1,4 milhão à CBBoxe e patrocínio de R$ 4,73 milhões da Petrobras, 24 pugilistas passaram a receber salários de forma permanente.O site da AIBA (International Boxing Association) ressaltava na capa o feito inédito do brasileiro com matéria intitulada ” Brazil makes history on Baku final day”.

O boxe convive com uma situação peculiar: a divisão entre o esporte profissional, que conseguia levar Popó ao horário nobre da Globo em pleno sábado, envolvendo cifras milionárias e regras específicas, e o amador, que é o esporte olímpico e convive com as limitações em países onde não tem tanta tradição, como é o caso brasileiro. Há regras diferenciadas para os dois, como o número de rounds (10-12 para o profissional e 4 para o amador), a utilização de protetor de cabeça apenas pelos amadores, e a marcação de pontos. Em 2009, foi criada a World Boxing Series, torneio com premiação em dinheiro e regras intermediárias entre os dois, com atletas do amador, e valendo duas vagas por categoria para os jogos Olímpicos, em uma tentativa da Associação de aproximar os dois.
O assunto é polêmico e não se pode perder de vista que, apesar da distinção no nome, a qualificação de amador ao boxe disputado nas Olimpíadas não significa que os atletas não são, e devam ser, remunerados de forma adequada pelo que fazem. Sem entrar no mérito da motivação dos atletas profissionais (que encontraram nas lutas agenciadas uma forma legal e legítima de praticarem seu esporte), considero extremamente danoso que um esporte conviva com uma divisão como essa que de um lado impede maiores recursos destinados aos atletas olímpicos, e acaba por não reunir os melhores atletas juntos na mesma disputa, e impedir confrontos que poderiam ser memoráveis, entre grandes personalidades de cada um. Não há dúvida de que mais do que as regras, que poderiam ser adaptadas, a divisão está mais ligada a percepção do esporte como produto com grande potencial de público e vendas.
Seria uma proposta vazia sugerir algo como unificar os dois boxes, ao menos por ora – e talvez tenha que haver diferença entre os dois mesmo, não conheço o boxe afundo para ter uma opinião tão firme sobre o assunto. O importante é que o amador conquista o reconhecimento necessário para se manter como esporte, ainda mais se tratando de uma modalidade olímpica. O direcionamento das verbas da Petrobras para o boxe, extremamente benéfico para o esporte este ano, abre espaço para o melhor desempenho destes atletas olímpicos, abrindo um círculo virtuoso que facilita a renovação do patrocínio e a conquista de novos – tenho a opinião que esportes de menor expressão são altamente dependentes de ídolos para se alavancarem e atrairem torcedores e novos praticantes. Torço (e acredito que) a conquista de Everton se torne um marco para o boxe amador, que vai a Londres com chances de surpreender e trazer medalhas.

1 Comentário
Camila
Muito bom texto, muito bom mesmo.
10 out 2011 02:10 pm
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