Novembro de 2007. Graciele Hermann está em Fortaleza nadando seu primeiro Campeonato Brasileiro, na categoria Juvenil 1 – única representante do Clube Brilhante, de Pelotas. Com verba restrita, o clube não tinha como fazer a atleta viajar, o que foi possível apenas depois de uma vaquinha, idealizada por Flávio e Luciano Castagno, nadadores master que treinam no clube. Assim, Graciele e seu técnico Nico conseguiram as verbas para garantir a participação no torneio. Depois de nadar as eliminatórias do 50 livre, o anúncio: ela estava na final do 50 livre com o 8º tempo, depois de se classificar com 28”80. A gaúcha comemorou muito e já tinha ligado para a mãe contando a novidade, quando o locutor anunciou uma retificação: na verdade, Graciele havia sido nona e era 1ª reserva. A pelotense, na época com 15 anos, chorou.
Dezembro de 2011. Em seu quarto, Graciele olha o papel onde havia colocado o símbolo do PAN, o símbolo das Olimpíadas e o tempo 25″20. O primeiro já estava riscado, depois da nadadora conseguir a vaga para a competição e voltar de Guadalajara com duas pratas na bagagem. O momento em que Graciele riscou os demais objetivos do ano, traçados no início da temporada, foi um dos mais emocionantes do ano passado, segundo suas próprias palavras. A cena ocorreu dias depois da nadadora marcar 25″12 no 50 livre na piscina do Maria Lenk e bater por oito centésimos o índice olímpico da prova.
Graciele Hermann nasceu em Pelotas, em 1º de janeiro de 1992, tendo recém completado 20 anos. Com 1,80m e magra, tem o porte ideal para as provas de velocidade – a nadadora foi comparada à alemã Britta Steffen, campeã olímpica do 50 livre, principal prova da nadadora gaúcha. Treinando há cinco anos no Grêmio Náutico União, em Porto Alegre, Graciele chegou a primeira Seleção Brasileira ano passado – já no absoluto, sem ter passado pelas seleções de categoria.

Comparado à média, pode-se dizer que Graciele começou “tarde” na natação. Aprendeu a nadar com 12 anos, começou a participar de estaduais competindo pelo Clube Brilhante, e seu primeiro brasileiro foi o citado acima, em Fortaleza, já na categoria juvenil 1. Foi na sua quarta participação em nacionais, em 2009, que Graciele ganhou a primeira medalha, curiosamente, na prova de 100 peito, no brasileiro de inverno realizado na metade do ano. Um ano depois, nadou abaixo de 26″ no 50 livre pela primeira vez, marcando 25″92 para vencer o Júlio Delamare. Em 2011, melhor ano de sua carreira até aqui, melhorou oito décimos e conseguiu o índice que desejava. Além dele, veio também o objetivo de conquistar a vaga no PAN, de onde saiu com duas medalhas – prata no 50 livre e no 4×100 livre, onde nadou as eliminatórias. Teve até desfile em Pelotas para comemorar os feitos.

Chamou a atenção o sorriso estampado depois de nadar as eliminatórias, quando passou de desconhecida para revelação da natação, ficando a oito centésimos do índice olímpico. Na final, nadou 0,05 mais forte e diminuiu para três centésimos a distância rumo à marca olímpica. Reação: comemorar de novo e ainda mostrar com os dedos o “três” que faltava. Lúcia Araújo, diretora do GNU e uma das principais pessoas a acolher Graci em Porto Alegre, ficou uma semana pulando de roupa na piscina depois do PAN, conforme prometido para a atleta. “E ela ficava: agora de pé, agora de ponta cabeça”. “E ficou faltando uma ainda, né?”, lembra a nadadora, que para as Olimpíadas não aceitou a sugestão de Lúcia de estender as quedas n’água para um mês e está bolando uma nova aposta.
Na república feminina do GNU, onde mora com mais quatro nadadoras, um quadro na parede da sala estampa a frase “Winners make commitments”. Graciele sai pouco e treina forte – são 10 sessões semanais de treinamento, além de musculação e parte física fora d’água. Ela acaba de voltar de três semanas em La Loma, no México, onde treinou com mais nove atletas do GNU em um dos mais modernos centros de treinamento de altitude do mundo. “Lá era bom que tudo era ótimo: piscina, acomodação, equipamento. E a gente só treinava”. Para aguentar a preparação, visando as Olimpíadas, Graciele trancou a faculdade de Fisioterapia, um pouco a contra gosto. “Semestre que vem eu volto. Não dá para parar de estudar: não quero, minha mãe não deixa, meu irmão me mata”.

Graci treinando sob a supervisão do técnico Fred
Graci sabe o que precisa melhorar para chegar a uma final olímpica. “Saída, e também tem algumas coisas da minha técnica que o PC viu que eu tenho que melhorar”. PC é Paulo Marinho, biomecânico da Seleção Brasileira, que vem fazendo um trabalho de avaliação dos fundamentos e da técnica de Graciele. Tranquila, a nadadora não costuma ficar muito nervosa antes das provas. Dorme bem e confia no trabalho realizado. Há três anos treina com Fred, técnico dos velocistas do GNU. “Adoro o treino dele, me dei muito bem”.
Com os resultados de 2011, o assédio dos grandes clubes para ter Graciele em suas equipes foi grande, mas a nadadora prefere não mudar o que está dando certo em pleno ano olímpico. O foco total está nas Olimpíadas, mas ela não vai passar por cima do Sulamericano, que acontece em Belém, a partir de 9 de março, nem do Maria Lenk, última seletiva da natação: “Minha vaga não está garantida”. Graciele também virou atleta militar e participará de dois treinamentos para se tornar sargenta.
Para 2012, há um novo papel no quarto da nadadora, com o tempo que quer atingir, mantido em segredo. Ela espera que para se garantir nas finais seja necessário nadar para 24″70. Hoje, 25″12 é o 26º melhor tempo do mundo na última temporada, e o 17º se consideradas apenas duas atletas por país, como será nos Jogos. E o que ela quer fazer depois de Londres? Treinar. “Não vai dar pra tirar férias. Quero participar das etapas da Copa do Mundo e do Mundial de curta também”.
Confira aqui a entrevista completa de Graciele ao Esporte em Pauta
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